[RESENHA] A Nuvem #2 - Neal Shusterman

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Título: A Nuvem #2
Autor: Neal Shusterman
Editora: Seguinte
Ano: 2018
N° de Páginas: 496
Skoob



Sinopse:
No segundo volume da série Scythe, a Ceifa está mais corrompida do que nunca, e cabe a Citra e Rowan descobrir como impedir que os ceifadores que não seguem os mandamentos da instituição acabem com o futuro da humanidade.

Em um mundo perfeito em que a humanidade venceu a morte, tudo é regulado pela incorruptível Nimbo Cúmulo, uma evolução da nuvem de dados. Mas a perfeição não se aplica aos ceifadores, os humanos responsáveis por controlar o crescimento populacional. Quem é morto por eles não pode ser revivido, e seus critérios para matar parecem cada vez mais imorais. Até a chegada do ceifador Lúcifer, que promete eliminar todos os que não seguem os mandamentos da Ceifa. E como a Nimbo Cúmulo não pode interferir nas questões dos ceifadores, resta a ela observar.

Enquanto isso, Citra e Rowan também estão preocupados com o destino da Ceifa. Um ano depois de terem sido escolhidos como aprendizes, os dois acreditam que podem melhorar a instituição de maneiras diferentes. Citra pretende inspirar jovens ceifadores ao matar com compaixão e piedade, enquanto Rowan assume uma nova identidade e passa a investigar ceifadores corruptos. Mas talvez as mudanças da Ceifa dependam mais da Nimbo Cúmulo do que deles. Será que a nuvem irá quebrar suas regras e intervir, ou apenas verá seu mundo perfeito desmoronar?
              Se você não leu o livro anterior, por favor leia a resenha do Ceifador || AQUI ||
A RESENHA POSSUI SPOILERS


A Nuvem quebra a maldição que os segundos livros das séries tem: serem os piores. Neal mostra sua destreza e habilidade para satirizar e ironizar a sociedade através de uma sociedade utópica e tão perigosa, porque tem os seres humanos como anfitriões dessa perfeição total.
"[...]Será que as pessoas sentem falta dos extremos vertiginosos da imaginação em suas vidas eternas e vazias? [...]" p.21

Citra Terranova agora é a ceifadora Anastássia. Sob seus próprios métodos de coleta, nossa jovem protagonista mostra-se sábia e forte diante uma responsabilidade tão grande e indesejada que é ceifar a vida de outros seres humanos. O último conclave de inverno transformou a jovem em uma mulher poderosa, influenciadora e odiada por muitos, porém seu amor pelo ex aprendiz de ceifador Rowan nunca mudou.

Rowan Dawish agora já sabe que o bem e o mal se misturam constantemente e que nem sempre conseguiremos optar por atitudes éticas e muito menos corretas. Sua sede por justiça e dignidade no trabalho da Ceifa é sua missão maior. Mesmo com sua rejeição por parte da entidade em se tornar ceifador, não o impediu de coletar. Porém suas coletas fazem parte do seu trabalho de justiceiro. Sob o codinome de Ceifador Lúcifer, o jovem elimina ceifadores que tem se comportado de forma imoral e gananciosa nas raízes da Ceifa. Seu trabalho é exterminar o mal de onde o bom senso e a sabedoria devem ser soberanas.
Em paralelo, a Nimbo-Cúmulo começa a questionar suas regras estabelecidas desde a Era Pós-Mortalidade. Ela observa que há algo maligno contaminando a Ceifa e seu maior medo é essa maldade colocar em risco o equilíbrio da sociedade. Seus cuidados e suas redes de observação não estão sob essa entidade. Os ceifadores tem total liberdade sob suas coletas e modo de vida. A Nuvem não pode de forma alguma interferir no trabalho da Ceifa. Sua onipresença não é real. Existem pontos cegos em alguns lugares e isso torna o trabalho a Nimbo incompleto. Suas regras devem ser quebradas, porém como uma inteligência artificial que foi criada para tomar decisões corretas podem infligir suas próprias regras?

Greyson Tolliver é um jovem que viveu praticamente aos cuidados da Nimbo-Cúmulo. Seus pais somente viajavam e suas irmãs nunca estavam presentes em seus momentos especiais. Ele se apegou profundamente com a Nuvem. Tudo que ele queria saber e conversar, a Nimbo fazia esse papel e por isso o desejo do garoto em trabalhar nos reparos da inteligência artificial, porém seus sonhos são frustrados quando ele toma uma atitude que é condenada pelo conselho da Nuvem. Ele então se vê sozinho e como infrator, já que quebrara regras, porém não sabia que aquele castigo tinha um propósito.

"Sou, por definição, justiça pura, lealdade pura. O mundo é uma flor em minhas mãos. Preferia pôr fim à minha existência a destruí-lo."
 
Anastássia agora é a personalidade que Citra deve que tomar nesse livro. Quando em O Ceifador, a jovem não queria de forma alguma se tornar ceifadora, a mesma se transformara em uma ótima profissional no que faz. Sua sabedoria e justiça são dignas de seus mentores: Ceifador Faraday e a Ceifadora Curie. A jovem mostra toda sua força e principalmente, influência sob a Ceifa. Seus pensamentos e posicionamentos levantaram muitos inimigos contra ela e por isso sente-se insegura nesse segundo volume e muito mais vulnerável, já que seu amor por Rowan nunca diminuíra mesmo com as decisões que ele tomara.
Rowan nos surpreendeu nessa continuação. O garoto ingênuo do primeiro livro desaparecera quase por completo e dera lugar para um homem forte, determinado e com sede de vingança e justiça. Ele é movido pelo objetivo de eliminar o "joio" do trigo na Ceifa. Após sua passagem pelas mãos do Ceifador Goddard, sua visão sob a instituição mudara e exigira dele atitudes mais enérgicas e contrárias aos ensinamentos de seu adorado tutor, o Ceifador Faraday.

Nesse segundo volume somos presenteados por uma destreza formidável do Neal que já tinha sido apresentada no primeiro livro. Quando em O Ceifador temos a demonstração de uma sociedade, na qual a morte não faz mais parte do seguimento da vida, A Nuvem nos mostra o lado obscuro de toda essa perfeição e nossa silenciosa Nimbo-Cúmulo ganha força e destaque.

"A sociedade devora e apodrece. A permissividade é o cadáver inchado da liberdade." p.177
A Nimbo demonstra toda sua sabedoria em suas inúmeras reflexões pelo livro. O livro anterior trazia parte dos diários dos ceifadores no início de cada capítulo. Nessa obra, temos os pensamentos da governante da Era Pós-Mortal. Sua preocupação é relevante e iminente. O mal assola os corredores e primordialmente, os corações dos ceifadores. A Ceifa é a única instituição não controlada pela infinita sabedoria da Nuvem e por isso ser a ruína da Humanidade.

Cada pensamento da inteligência artificial vai destrinchando nossas almas de forma visceral e indiscreta. O autor conseguiu nos apresentar um panorama de nossa ganância e depravação através de atitudes preconceituosas e egoístas tomadas pelos responsáveis pela a função mais importante da nova sociedade: coletar vidas. Controle populacional e não um abatedouro.

Nossos dois jovens personagens mostram a dualidade que tanto Nietzsche e Kant mostram em suas obras. A moral e a imoralidade andam lado a lado. O Mal e o Bem são inseparáveis. Nossas atitudes não definem quem somos, mas determinam nosso espaço. Rowan é a essência que Maquiavel fala em O Príncipe.  A Justiça não existe sem propósito e o objetivo do jovem é eliminar os maus costumes da Ceifa através da morte. Já Citra vem com a repreensão e a sabedoria. Seria como Neal mostra-se que um não existe sem o outro. Se observamos a Política, o rei deve ser amado e odiado, pois ele ajuda o povo, mas não pode aceitar péssimas práticas éticas, sociais e morais em seu reino e por isso é odiado.

Greyson é o personagem que começa como um peão no xadrez e termina como rei. Ele é completamente ingênuo e por isso vive numa mesmice sem fim e por isso quando seus sonhos acabam o levando a um teia de conspirações, ele percebe que mesmo numa sociedade aparentemente perfeita existe sede por poder e uma ganância sem fim.

"[...]Mas naquele momento era ele quem estava quebrado. E não havia nanitos suficientes no mundo para corrigir aquele mal." p.300 
O livro tem quase quinhentas páginas, porém são insuficientes para satisfazer nossa curiosidade, porque a leitura é fluída e com muitas reviravoltas. Enquanto em O Ceifador temos uma previsibilidade saudável, em  A Nuvem temos surpresas a cada capítulo que deixam os leitores incapazes de controlar suas emoções. 
A obra é narrada em terceira pessoa em quase sua totalidade, mas mescla com a primeira pessoa devido as reflexões da Nimbo-Cúmulo. São quarenta e sete capítulos em uma fonte agradável e ótima para leitura mesmo para uma obra volumosa. A capa traduz bem Citra e Rowan.

"[...] Um contra o outro. Os dois contra o mundo. Tudo na vida deles era definido por aquela dualidade." p.484
 
A Nuvem é a continuação de um enredo eletrizante e profundamente político através de boas doses de ironia e sarcasmo com um fundo reflexivo e filosófico.   



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